Porque escrever pode ser o seu último
pedido antes de fritar seus miolos em uma cadeira elétrica? Talvez seja uma
forma de expurgar meus pecados de forma simples e resumida, já que eu não
acredito em Deus. Enfim, permita-me me apresentar: me chamo Frederic King, mas
a galera costumava me chamar de Fred.
Minha vida já começou daquele
jeito, quando fui concebido em um beco de Manhattan por um usuário de drogas e
uma moradora de rua (também usuária). Desde pequeno tive que conviver com as
drogas, porém nunca tive interesse ou vontade de usar, justamente por esse
motivo apanhei muito da minha “mãe”. Você deve estar nessa parte pensando que
tipo de mãe é essa, não é? Bom... ela não batia muito bem da cabeça mesmo,
aliás, sempre batiam a cabeça dela na parede por conta das dívidas com as
drogas. Decidi fugir de casa – se é que devo chamar assim a lata de lixo que eu
morava no beco – aos 7 anos de idade. Sem rumo, sem nada.
Depois de vagar pedindo comida,
brigando com pombos, fui parar em Little Italy, onde comecei a fazer minha
vida. Á princípio, arrumei um trabalho de engraxate na frente da quitanda de
Tony, dava pra ganhar uns trocados com aquele trabalho, mas ainda não tinha
onde dormir. Uma noite enquanto dormia na rua, roubaram minha caixa de
engraxar, então tive que arrumar outro emprego. Por sorte, eu vivia na rua,
engraxava já a quase 1 ano e justamente por não aumentar o preço do serviço (e
isso não foi uma atitude burra), ganhei clientes importantes do bairro, da
cidade... talvez até do Estado. E foi assim que eu fui atrás de Vito.
Vito era um um dos integrantes da
família mais respeitada de Little Italy, não irei falar o nome para não os
entregar. Conversei com ele e passei a fazer pequenos serviços, como fazer
compras, entregar recados e claro, engraxar os sapatos, em troca de moradia e
alimento. Vito confiava em mim, via “o filho que nunca tive” como costumava
dizer, me matriculou em uma escola e me tratava muito bem. Tudo aconteceu muito
rápido para mim, que sai literalmente do lixo, e estava amando. Queria ajudar
ainda mais Vito, mas ele nunca deixava.
- Quando você tiver idade, filho,
te precisarei de você. Por hora, se concentre nos estudos para ser alguém na
vida.
E foi assim, foquei nos estudos
até o meio do Ensino Médio, quando fui chamado por Vito em sua sala. Em todos
os anos que vivia naquela casa nunca fui chamado aquela sala, poucas pessoas
entravam ali, e eu nunca tive curiosidade de estar lá. Entrei, tive uma
conversa com Vito. Ele me perguntou se eu podia fazer qualquer coisa por ele,
já que sempre pedia. De início, achei esse papo estranho, mas ele me explicou
melhor. Um dos grandes negócios da família é, até hoje, o tráfico de armas e
agora que eu era um “menino crescido” – como ele mesmo gostava de dizer –, já
poderia ajudar ele de uma forma melhor.
Você deve estar se perguntando como eu nunca percebi isso antes, não é?
Simples, Vito me mantinha ocupado o dia inteiro. Eu estudava, fazia aulas de
etiqueta e praticava futebol, tudo financiado por ele. Chegava em casa já era
no fim de tarde e todas as atividades eram normais. Nunca perguntei nem pedi
nada á ele, já que eu era grato por ter um teto sobre minha cabeça e alimento
no prato.
Depois da conversa que mudou
minha vida, já tive minha primeira missão. Haviam outras famílias em Little
Italy, e uma delas em especial estava se intrometendo nos negócios de Vito.
Alvejar o chefe da família seria muito difícil, então teria que começar pelo
filho. Confesso que foi bem mais fácil do que eu pensei. Vito me deu uma arma
carregada, me ensinou a usar e disse o que fazer. Encontrei o “alvo” em uma rua
não tão movimentada no fim de tarde, saquei a arma e atirei 6 vezes, acertando
três, dois no peito. Com 17 anos, eu tinha matado pela primeira vez e em
momento algum eu senti pena, culpa ou remorso. Voltei pra casa, coloquei a arma
na mesa de Vito e avisei que o serviço estava pronto. Instantes depois ele
recebeu um telefonema falando que o filho do outro chefe havia sido baleado e
morto, Vito me parabenizou na hora e a partir dali me tornei o que sou até
hoje, o que serei até o momento em meu último miolo derreter e meu olho
descolar da orbita por conta da voltagem alta.
A partir dali eu tive que sair da
escola, aprendia o que dava lendo em casa. Era chamado para “missões”
frequentes. Basicamente consistia em matar, roubar, obter informações
necessárias de forma eficaz (tortura inclusa, claro) e fazer o acordo ou
entrega do carregamento. Era simples, eu impunha respeito em todos e se não
respeitassem, eu tinha o total direito de eliminar do mapa de forma rápida e
eficaz. Nenhuma dessas missões em si foram tão marcantes quanto a primeira, a
qual já mencionei. Era mandado para o bairro chinês, árabe, já cheguei a ser
mandado até para outros Estados. Claro que minha vida não ia passar
despercebido, eu era conhecido nesse submundo e quase sempre tinha alguém
tentando ter minha cabeça como troféu, mas como podem perceber, não
conseguiram... e foi por pouco.
O motivo da minha prisão é uma
coisa tão banal e idiota, que acho desnecessário entrar em detalhes. Basta
dizer que foi uma enrascada muito malfeita em que eu caí. Tráfico de armas não
dá pena de morte, mas assassinatos sim.
E neste momento você, o leitor
dessa carta, deve estar se perguntando se eu sinto culpa, remorso, ou qualquer
merda desse tipo agora no meu leito de morte (ou cadeira, no caso) e a resposta
é direta e contém três letras: NÃO! E sabe por que?
Porque se eu não tivesse ido
atrás de Vito e ajudado em tudo que ele me pediu e propôs, eu teria sido um zé
ninguém e moraria no lixo, provavelmente se rendendo a tentação das drogas
igual aconteceu com a minha mãe ou com meu pai – o qual nunca fiz ideia de quem
era –. Hoje sou conhecido, fui respeitado na prisão, respeitado fora dela e
serei lembrado para todo sempre.
Enfim o guarda me chama, tá na hora de fritar um pouco. Tenho alguns agradecimentos a fazer, primeiro ao ser vivo que roubou minha
caixa de engraxate porque se não fosse ele, eu não teria trilhado esse caminho.
E também claro, agradeço a Vito pela oportunidade e por toda a ajuda que pode
me dar ao longo dos meus 23 anos que acabam hoje. Vida curta, não? Mas vou sem arrependimento, afinal só se vive uma vez.
:/
ResponderExcluirNão sei o que dizer...
Estou sei lá...
Amei
hahah
ExcluirForte pacas hahah
Caramba, muito bom. Uma história diferente que passa a mensagem de viver a vida como se pode, e sem arrependimentos.
ResponderExcluirObrigada por ter participado da Promoção 101 no My Life, estou postando lá seu texto.
Ótimo final de semana,
http://mylife-rapha.blogspot.com